A cena é clássica: a mãe para o carro na porta da escola. Desce, solta o cinto de segurança da criança, que está na cadeirinha no banco de trás. Ajuda a criança a descer e a carregar a mochila e vai encaminhando o filho ou a filha para o portão.
Nesse ponto o passo da criança muda, fica lento, ela começa a trançar as pernas nas pernas da mãe. Escorrega para as costas da mãe, se esconde e não cumprimenta o porteiro de jeito nenhum.
Já dentro da escola, abaixa a cabeça e passa batido, sem olhar e sem falar com ninguém. Encarar adultos e crianças é muito difícil para um pequeno tímido. Beira o sofrimento mesmo.
Os pais juram que dão a melhor educação e se culpam pelo comportamento do filho, que não cumprimenta, não fala e não olha nos olhos.
Nada disso é doença, é grave, ou perigoso. O nome é timidez na infância, uma condição que acomete vários pequenos, não é frescura e deve ser encarada com leveza e no sentido de superar as dificuldades.
O que leva à timidez na infância?
Em geral, meninos e meninas são bastante espontâneos e sinceros, conseguem se comunicar e são francos em suas colocações. Não é esse o caso de uma criança tímida. Intimamente, a timidez na infância é provocada por algum grau de ansiedade e por uma super cobrança interna.
A ansiedade, segundo os especialistas, nasce da vontade de controlar tudo, de prever o que vai acontecer, e a antecipação mental da obrigatoriedade de se relacionar e interagir com as outras pessoas do ambiente.
A cobrança interna, em parte, nasce com a criança, vem com a personalidade dela. Em parte, ela aprende com o exemplo dos pais e da família. Como se sente julgada, ela mesma aprende a se julgar e se retrai com a análise constante.
Por isso, o que os pais devem entender é que a timidez infantil pode ser muito amenizada com a construção de um ambiente acolhedor, com pouco julgamento e com estímulo para a criança se sentir segura e confiante consigo mesma.
Falando assim, pode parecer distante e genérico demais. Na verdade, é mais simples do que aparenta. Existe uma série de atitudes que os pais podem tomar e outras que seria muito bom evitar.
Novidades
Crianças tímidas detestam novidade, não lidam bem com situações inéditas e pessoas desconhecidas. Por isso, sem pilhar demais, sempre que for rolar novidade, converse com a criança antes. Explique o que vai acontecer e como será o passo a passo daquele momento.
Talvez, os pais não vejam mudanças no comportamento do filho, que vai seguir de olhos baixos e cheio de vergonha. No entanto, lá dentro daquela cabecinha e daquele pequeno coração, a criança está processando e repassando o antes, o durante e o depois.
Não force a barra, mas não deixe de estimular
A timidez na infância piora muito quando os pais erram a mão e pegam no pé, brigam e pressionam a criança para que cumprimente os parentes, abrace os avós, brinque com os outros meninos e meninas.
Dê um tempo, deixe seu filho chegar, se apropriar do ambiente, relaxar. Isso pode levar um tempinho. Não aumente a ansiedade. Dê a ficha do lugar (quem é quem, onde é o banheiro, mostre a quem a criança pode pedir ajuda) e deixe ela conquistar o espaço.
Beijo, abraço e aperto de mão
Respeitar a timidez infantil não significa permitir que a criança cresça mal educada. Cada família pode e deve estabelecer quais são as interações fundamentais e quais são negociáveis.
Por exemplo, não precisa beijar e abraçar cada tio na festa do Natal, mas precisa olhar nos olhos e cumprimentar com um “Boa noite!” audível. Não precisa sentar no colo da vovó, mas precisa responder às perguntas dela sim. Civilidade se ensina com firmeza, tranquilidade e exemplo.
Esconde-esconde
Pais de crianças tímidas costumam agir de duas formas. Ou ficam brabos, frustrados, e pressionam a criança para interagir (e assim pioram a timidez na infância, porque aumentam a sensação de julgamento).
Ou superprotegem o filho, justificando todas as suas atitudes e passando a mão na cabeça mesmo quando a postura passa do aceitável.
Nem um, nem outro. Equilíbrio, leveza e relaxamento são os melhores conselheiros. Nem torturar a criança, nem fingir que nada está acontecendo.
Deixar a criança mais solta e agindo mais espontaneamente, sem tanto controle, pode ser uma boa medida. Experimente. Oriente antes, relaxe durante, e comemore os bons comportamentos depois.
Nem pior, nem melhor
Evite expor as questões do seu filho em público, principalmente se ele estiver junto. O clássico “o gato comeu sua língua?” não precisa acontecer. Não se queixe da timidez da criança para os parentes e nem deixe ela ouvir suas reclamações.
Pior do que expor o filho é elogiar. Acredite, embora seja gostoso ouvir suas qualidades, para um tímido isso pode ser mega desconfortável. Ele não gosta de ser o foco da conversa e nem de estar no centro das atenções.
No pé do ouvido
Ao contrário, elogios em particular, comemorações por cumprimentos, interações e outros comportamentos, quando são feitos diretamente para a criança surtem bom efeito, fortalecem a autoestima e a estimulam a continuar.
À medida que a criança cresce, a timidez tende a diminuir. Porque a criança vai se acostumando com as pessoas, os ambientes e a rotina. Quando sente que a família, os pais, ou o professor não a estão julgando, ela relaxa e vai experimentando alguma confiança.
Quando tem certeza de que não é o alvo dos comentários, que não está no centro do palco (porque há outras crianças na família e na escola; porque ele não é obrigado a nada; porque os parentes respeitam que ele não quer contato físico), a criança vai chegando e se colocando.
Por isso, delicadeza e serenidade por parte dos pais ajudam muito. Cada criança é uma com qualidades e dificuldades próprias, diferentes daquelas dos irmãos, dos primos e dos amigos.
Quando os pais dão a oportunidade para os filhos — mesmo os mais tímidos — expressarem o que trazem por dentro, boas surpresas aparecem e a criança cresce mais feliz.
Agora que você já sabe o que rola e o que não rola no enfrentamento da timidez infantil, tem duas lições de casa, aprender bem o conteúdo e compartilhar com todo mundo pelas redes sociais. Quanto mais gente souber como agir com uma criança tímida, melhor!